terça-feira, 27 de novembro de 2007

Sebastião Nery e a TV Pública

Notórios e notáveis

Antonio Candido de Melo e Sousa, paulista carioca, mestre da crítica literária (autor, entre outros, dos clássicos "Formação da literatura brasileira" e "Literatura e sociedade"), criticou Gilberto Freire porque escrevia seu nome com "y" ("Freyre") e não com "i" ("Freire").

Gilberto Freire não gostou, mas não reclamou. Algum tempo depois, Antonio Candido telefonou para Gilberto Freire, que atendeu: - Quem fala? É o Antonio Candido? O Antonio sem o circunflexo no "ô" de "Antônio" e no "â" de "Cândido", com "Mello" de dois "elles" e "Souza" com "z"?

Suassuna

Mas os pernambucanos nem sempre são tão sutis. João Alexandre Barbosa, consagrado crítico literário, fazia concurso para a Universidade de Pernambuco. Na banca, o renomado professor Antonio Candido, e o extraordinário Ariano Suassuna. Antonio Candido elogiou Alexandre:

- Ele tem notório e notável saber.

Suassuna interrompeu Antonio Candido:

- Até concordo com o professor Antonio Candido. Mas há uma grande diferença entre notório e notável. Alguns políticos de Pernambuco são ladrões notórios. Já Lampião foi um ladrão notável.

PSDB

O PSDB foi fundado dizendo-se um "partido de notáveis". Agora, o procurador geral da República, Antonio Fernando de Souza, mostra que não é bem assim. Tem seus "notáveis". Mas também um punhado de "notórios".

O "mensalão" do PT tinha o mesmo DNA do "mensalinho" de Minas. Não importa que o tamanho da roubalheira não tenha comparação. Mas está provado que os tucanos mineiros também têm seus "notórios".

Pernambuco

No jogo do poder nacional, Pernambuco há bastante tempo só tinha forte mesmo o matuzalêmico e perpétuo "notável" Marco Maciel. De repente, brotou uma safra nova de "notáveis": Sergio Guerra na presidência nacional do PSDB, José Mucio Monteiro como ministro da Articulação Política e Mauricio Rands como líder do PT na Câmara. Lula não vale. Não é Pernambuco, não é São Paulo, não é deste mundo.

Patrus

O PT é filho de cobra. Nunca tem nada a ver com a mãe ou os filhos, sejam idéias ou atos. Em um jantar do PT em Juiz de Fora, o ministro do Bolsa Família, Patrus Ananias, das melhores gentes do partido, perguntado sobre o golpe do terceiro mandato para Lula, derrapou na História:

"E se o povo quiser"?

Se a lógica fosse essa, o PT, o Patrus e os milhares de companheiros deles e nossos, presos, cassados, torturados (os assassinados foram calados) em Minas, estariam impedidos de qualquer crítica ao golpe de 64, porque "a maioria do povo quis". Enganada, engambelada, estupidificada, mas quis. Se o critério é "o que o povo quer", Medici foi melhor do que Lula.

"Voz do Brasil"

Durante décadas, a gula dos donos de rádios no País tudo fez para fechar a "Voz do Brasil". Alegavam que já havia rádios de sobra e não era preciso mais uma hora cativa para notícias do Executivo, do Congresso e do Judiciário. O argumento era de um cinismo de hiena bêbada.

Quem já viajou pelo País inteiro, sobretudo tempos atrás, sabe que há imensas regiões onde as outras rádios não chegam, porque a população é pequena, rala e não interessa aos anunciantes pagarem audiências mínimas.

Pois é exatamente nesses lugares que a "Voz do Brasil", mesmo até hoje, é a única fonte de notícias públicas, ou governamentais, para a população.

TV Globo

Hoje, com a TV, melhorou bastante, mas é ilusão imaginar que a TV particular vai a toda parte e sobretudo com notícias de interesse coletivo. Uma noite, e não foi há muito tempo, viajando de carro, no interior de Roraima, a caminho da Venezuela, de Boa Vista a Santa Helena, na fronteira (ia conhecer o petróleo do Orinoco), tentei ter alguma notícia. Ali só se pegava a Globo que, naquele dia, por falta de transmissão, não estava chegando. Na chuva, salvaram-me um motel de beira de estrada e não o Rum Creosotado do anúncio, mas a "Voz do Brasil".

TV Pública

A Câmara viverá esta semana a primeira batalha da TV Pública (a medida provisória criando a EBC, Empresa Brasileira de Comunicação).

Para ser mais uma "TV do governo", não teria sentido: a TV Globo já está aí, cumprindo airosa e voluptuosamente sua bem paga função, agora ajudada pelo novo soldado do governo, o "bispo do povo" Edir Macedo.

Mas a TV Pública pode ser mesmo uma "TV Pública" sem ser uma TV do governo. Se a Inglaterra, a França, a Itália, a Espanha, toda a Europa, conseguiram criar e manter televisões públicas (como a BBC, as francesas, as italianas, a espanhola, a portuguesa) realmente públicas e não governamentais, por que no Brasil não conseguiríamos?

Vai depender muito da vigilância do Congresso e da própria imprensa। Sobretudo de nós jornalistas. Se há tanto tempo os conhecemos, devemos um voto de confiança a profissionais honrados e provados como Franklin Martins, Tereza Cruvinel, Helena Chagas, Orlando Senna, que estão no comando. Olho neles e, se não for o que se espera, pau neles.

http://www.tribuna.inf.br/coluna.asp?coluna=nery

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